Santa nasceu chique. Ou melhor, nasceu...Santa. No século XIX, com a chegada das missões estrangeiras que acompanharam Dom João VI, os ricos e poderosos escolheram o morro para viver: a vista era linda, a água, de melhor qualidade, e o clima, mais ameno. Naquela época, abriu-se a primeira via de acesso, a Rua Dona Luzia, hoje Candido Mendes, e iniciou-se um verdadeiro boom imobiliário. No final do século, o bairro já estava completamente povoado por casarões nobres. A ocupação era predominantemente europeia. No começo do século XX, com o burburinho dos visitantes, a maioria artistas que vinham se apresentar no Municipal, muitas mansões passaram a abrigar hotéis de luxo, como o velho Hotel Santa Teresa. Santa tornou-se a Montmartre carioca (o bairro onde nasceu o internacionalmente conhecido cabarét Moulin Rouge Paris). Nos anos 60, no entanto, o glamour começou a descer a ladeira. O primeiro motivo foi uma tempestade de três dias seguidos, em 1966, que destruiu casas, matou pessoas, isolou o bairro e expôs a fragilidade da infra-estrutura local. Paralelamente, as favelas do entorno se multiplicaram. Aos poucos, os moradores endinheirados partiram e os imóveis passaram a ter preço de banana.
A partir de 1999, as coisas começaram a mudar. Estrangeiros começaram a subir o morro, atraídos pelo charme natural, já que pouca coisa acontecia por lá. As casas estavam ocupadas por artistas locais e alternativos em geral. Lá por 2002, teve gente que resolveu trazer uma rede internacional de turismo e hospedagem, para hospedar turistas que apareciam de mochila nas costas e não encontravam hotel. É conhecida como "Bed and Breakfest". O Cama e Café acabou gerando uma importante mídia espontânea que divulgou a região lá fora. Santa Teresa entrou no roteiro do guia "Lonely planet", a bíblia dos viajantes, e ganhou matérias em jornais importantes como o inglês "The Guardian" e o americano "The New York Times", além de diversas reportagens em revistas. Dos muitos gringos que bateram pernas pelas ruelas, alguns ficaram e compraram casarões, atraídos pelos preços acessíveis. Santa Teresa viveu, então, um novo boom imobiliário. E aí todos os tipos de infraestruturas foram levantadas para abranger os novos turistas que se hospedavam em Santa Tereza, principalmente franceses. Lá pelas bandas de Paris, o Rio de Janeiro era apenas samba, suor, carnaval, mulheres, futebol e violencia. Devido a comparação com o bairro francês, muitos artistas instalaram seus ateliês nas ruas de Santa. Há anos, diversos Centros Culturais Municipais, Cinemas, Projetos, exposições, museus, teatros, oficinas, workshops e bibliotecas, foram se multiplicando em Santa.
O Carnaval tb faz parte de Santa Teresa com o unico bloco "comportado" do Carnaval: o Bloco das Carmelitas! Existe no alto do Morro o Convento de Santa Teresa e o bloco todos os anos representa uma espécie de fuga do Convento, o abandono do Hábito e o cair na Folia. Os católicos mais ortodoxos odeiam e acham uma falta de respeito. Cada um pensa o que quiser, mais sair fantasiado de freira ou de frei no Bloco das Carmelitas é divertidíssimo!
A Chave Mestra, Associação de Artistas Visuais de Santa Teresa, possui no site todos os projetos artísticos e culturais que ela promove, inclusive o evento mais conhecido que faz parte do calendário cultural da Prefeitura do Rio, o "ARTE DE PORTAS ABERTAS". Todos os ateliês do bairro abrem suas portas e garagens para qualquer pessoa apreciar e comprar os trabalhos. O evento ocorre normalmente em Julho, mas pode haver mais de um evento por ano, com seu devido mapa de ateliês.A marca mais conhecida de Santa Tereza são os Bondinhos de Santa Teresa, os unicos bondes remanescentes do Rio Antigo, e os unicos bondes que ainda circulam no Brasil, que ainda estão em pleno funcionamento. Por um preço exclusivamente barato (R$ 0,60 comparado a passagem de onibus de R$ 2,20), vc pode passear pelas ruas de Santa saindo da estação que fica no Centro, ao lado do prédio da Petrobras, passando por cima dos Arcos da Lapa e subindo até quase o Morro dos Prazeres. Inclusive com um passeio próprio até o Cristo Redentor. Se vc estiver pelas ruas de Santa e seguir o ditado ao pé da letra "pegar o bonde andando", ficando nos beirais, sem se sentar, vc anda de graça. Com a velocidade do bondinho e os rangidos dele, parecendo que o bondinho vai se desmontar a qualquer momento, é uma aventura única!
Aliás, o Morro dos Prazeres abriga um casarão centenário, que já passou de mão em mão, desde instituições particulares ao Governo Federal, hoje nas mãos da Prefeitura, conhecido como Casarão dos Prazeres, onde tenho lembranças históricas por ter sido minha primeira reportagem e nessa época os condutores de bonde estavam em greve, um Centro Cultural que dá lugar a várias aulas de arte plástica, dança e música para jovens moradores de seu entorno. É lá que acontece o Comunid’Arte evento onde moradores de favelas de Santa Teresa expõem seus trabalhos artísticos. O Casarão dos Prazeres é o centro de exposições e atividades educativas e comunitárias que a Secretaria Municipal de Educação mantém. No dia em que pisei ali pela primeira vez, toda a comunidade estava organizando a primeira apresentação de Balé Infantil do Casarão dos Prazeres.
A Prefeitura do Rio tem tanto conhecimento do Casarão, que quando eu fui na própria Secretaria de Educação, muitos funcionários além de desconhecerem e nunca terem ido lá, acharam que eu estava fazendo uma matéria histórica de um Puteiro!
Só por esse pequeno detalhe que qualquer um pode imaginar que Santa Teresa não é o pedaço de céu cercado de favelas por todos os lados. Não tem menos violência e falta de segurança pública do que no resto do Rio de Janeiro, existem diversos e milhares de problemas de transporte público e uma única empresa monopólica que atende ao bairro, lá existem índices significativos de crimes, como assalto a mão armada e estupros, e de vez em quando facções rivais tentam tomar o poder das favelas dali, fazendo com que tenham incursões e blitz policias, inclusive do BOPE, mas que EU VI COM MEUS PRÓPRIOS OLHOS, o que a cultura pode fazer com a cabeça de uma criança que vive e cresce numa comunidade cercada pelo Comando Vermelho. E que o mínimo de infraestrutura e revitalização do bairro é construído pelos próprios moradores.
Como se todo mundo fosse morro...
Fotos:
André Claudio Mendonça