Esquizofrenia



LIVRO DE VIAGEM


                       Não há coisa pior do que pessoas mal preparadas para dar informações.
 Sr. Genaro, italiano (75 anos), estava se preparando para fazer sua segunda viagem de volta à sua terrinha, quase 50 anos depois que saiu de lá.  Passaporte velhinho, foto amarelada, começou ele mesmo a tratar da renovação do passaporte para a sua tão sonhada viagem, que ganhara por participar de um sorteio.
 Como não conhecia e não entendia nada de internet, resolveu tentar resolver pessoalmente a questão.  Afinal, era só para renovar e não para tirar um novo passaporte, o que achava que iria ser mais fácil.  Foi até o posto da Polícia federal, depois de muito rodar à pé procurando e se dirigiu ao balcão de informação onde encontrou lá outro senhor, o Sr. Tanaka, um  japonês já de meia idade, quase a mesma do sr. Genaro e que tinha sido remanejado de outro setor, por atrapalhar o serviço dos outros colegas de trabalho.
Sr. Tanaka nunca tinha visto um passaporte na vida e seus pais (bota tempo nisso) chamava os passaportes de livro de permissão de viajem e colocou uma faixa na frente do balcão, informando para quê ele estava atrás daquele balcão: “AQUI - LIVRO DE VIAGEM” .Sr. Genaro estava procurando uma placa escrita PASSAPORTE, enquanto todo mundo lhe indicava o balcão do Sr. Tanaka.  Ele então foi ele ter com o Sr. Tanaka.
- É aqui que renova passaporte ?
- Passaporte ? não, livro de viajem né ?
- Mas eu não quero livro, eu quero renovar meu passaporte.
- O senhor não quer viajar ?  pergunta Sr. Tanaka.
- Claro que sim.
- Então vai precisar de livro de viajem.
- meu senhor, depois eu compro livro, agora eu só quero renovar meu passaporte.
- Depois o senhor fazer isso aí, agora precisar de livro de viajem né ?
- mas o que é isso ? venda casada ? o que está acontecendo aqui ?
- Meu amigo não grite, aqui é local de silêncio.
- silêncio uma ova, isso não é hospital, é a polícia federal.
- O senhor procure ser mais claro no que deseja. (insiste o sr. Tanaka)
- Mais claro ainda ? já disse, eu quero viajar e pra isso eu preciso renovar o passaporte.
- Olha, esquece esse negócio aí de passaporte que isso é nome de whisk e não fornecemos informações para bêbados nem alcólatras.
- Mas quem é que está bêbado aqui ?  O senhor ficou louco ?
- Calma meu amigo, o senhor está se alterando, deve ser o efeito da bebida.
- mas que bebida meu amigo, o senhor não tem noção do que está dizendo.
- Se o senhor não se acalmar, terei de chamar o segurança por desacato.
- Isso não pode estar acontecendo, só pode ser um pesadêlo.
- Senhor, tem outras pessoas querendo ser atendidas, diga logo o que o sr. Quer.
- Já disse, eu quero renovar meu passaporte.
- mas que passaporte, o sr. só insite nisso ! Já disse que aqui é lugar de livro de viajem.
- O senhor está brincando comigo não está ?  ESTÁ BEM ! Eu compro este livro de viagem.
- Senhor, aqui não vendemos livros..
- o senhor está querendo me enlouquecer ou o quê ? há duas horas só fala nesse maldito livro e agora que finalmente eu quero comprar, o senhor diz que não vende ?
- Mas quem foi que disse que eu vendia livros aqui.
- Isso não está acontecendo.
- O que não está acontecendo ?
- O senhor quer me dizer o que está fazendo aí do outro lado do balcão ?
- isso aqui é um guichê de atendimento para pessoas que precisam de livros de autorização para viajar.
    
                     Foi quando caiu a ficha do seu Genaro. Ele então apanhou o seu passaporte do bolso e mostrou ao seu Tanaka e disse, com toda calma que o desespêro pode proporcionar:
- por acaso este livro é parecido com isso aqui ?
- mas então o senhor também tem um livro.  Porque não disse logo.  O senhor não precisar tirar um, é só renovar.
- Jura ?
                     Seu Genaro teve um acesso de fúria e destruiu todo posto da polícia federal, que o algemou e o levou preso por desacato e destruição do patrimônio público.  Depois de interrogado, o delegado até entendeu os motivos da raiva e ainda queria ajudá-lo.

- Olha seu Genaro, pelo o que o senhor fez eu não posso soltá-lo, mas como o senhor é estrangeiro, eu poderia extraditá-lo para a Itália. O senhor ficaria pouco tempo preso e iria poder passear pela sua terra e com as passagens paga pelo governo daqui e de lá, não seria ótimo ?   
- Sim, claro, quando posso ir ?
- Receio não poder ajudá-lo.
- Mas porque não, doutor delegado ?
- Seu passaporte está vencido.

                                                                                 Por: Amadeu Epifânio



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